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Mulheres vitimizadas encontram dificuldades onde deveriam ser acolhidas

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Da Reportagem

A violência contra a mulher é tema recorrente neste período eleitoral e os destaques às políticas públicas de combate ao feminicídio estão entre os assuntos mais debatidos e manifestados nesse momento de campanha. A promessa de dias melhores para o acolhimento, atendimento e amparo psicológico e jurídico para as vítimas permeia quase todos os discursos de candidatos.

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Por conta do assunto em evidência, a nossa reportagem saiu em busca de informações sobre a atual situação de violência contra a mulher em Guarujá e como é feito o acolhimento às vítimas no município. Nossa primeira parada foi a unidade da Delegacia de Defesa da Mulher (DDM) de Guarujá, e a impressão não foi das melhores.

Logo no hall de entrada uma idosa, acompanhada pelo marido também idoso, reclama que foi orientada pelo “homem” que a atendeu para se dirigir à Delegacia Sede. Uma porta de vidro, trancada, dá acesso ao hall de entrada para o interior da delegacia, onde fica a recepção. Quem busca por atendimento deve tocar uma campainha e aguardar ali mesmo.

A doméstica Laura (nome fictício, para preservar a identidade da vítima), 40 anos, chega ao local e toca a campainha. O investigador abre a porta de vidro e pergunta do que se trata. Ali mesmo, em frente aos demais presentes. A mulher, meio constrangida, pergunta se não pode entrar para falar sobre o seu assunto.

O investigador a coloca para o lado de dentro da porta, mas pede para que ela faça um breve relato ali mesmo sobre o assunto. Falando baixo, a mulher conta rapidamente sobre seu problema, e sai novamente para aguardar do lado de fora, no hall de entrada, até que o investigador retorne para chamá-la.

“Aqui não é a delegacia da mulher?”, ela pergunta para uma pessoa ao lado. “E se eu não quisesse falar com um homem, mas com uma mulher?”, questiona a munícipe. Logo mais, o investigador retorna e a leva para o interior da delegacia. Entre o toque na campainha e a sua entrada no local foram 30 minutos de espera. A delegacia, aparentemente, estava vazia.

Tentamos contato com a nova delegada titular da DDM, Lígia Cristina Villela, mas não conseguimos encontra-la no local durante a semana. A delegada se divide hoje entre as funções de assistente na Delegacia Sede do Município e titular da DDM.

“Ela vem todo dia para despachar, mas se divide entre as duas delegacias. Então a gente não sabe ao certo quando ela vai estar aqui ou lá”, explica um dos escrivães da DDM. Questionado se existe dificuldade com a ausência dela para a realização do trabalho responde: “Hoje em dia tem telefone. A gente liga se precisar”, afirma.

O funcionário não confirmou quantas pessoas fazem parte da equipe na delegacia. “Esse tipo de informação apenas a delegada pode transmitir”, relatou. Questionado sobre o atendimento às vítimas de violência ele explica: “estatísticas nós não podemos fornecer. Quando recebemos um caso de violência fazemos o Boletim de Ocorrência (BO) e encaminhamos a vítima para a assistente social que fica aqui na DDM. Ela recebe a pessoa com o BO e a encaminha para agendamento no Centro de Referência Especializado de Assistência Social (CREAS).

A reportagem também não conseguiu falar com a assistente social, pois nesta semana ela está afastada por licença médica.

As Delegacias Especializadas de Atendimento às Mulheres são um marco na luta feminista. Elas materializam o reconhecimento da violência contra mulheres como um crime e implicam a responsabilização do Estado no que se refere à implantação de políticas que permitam o combate a esse fenômeno.

Em Guarujá, o atendimento e acolhimento se demonstra precário

Em 2019, Guarujá inaugurou uma nova sede da Delegacia de Defesa da Mulher com salas para atendimento psicológico e psicossocial e área de playground para crianças que estivessem acompanhando possíveis vítimas. O objetivo era transformar a DDM Guarujá em um local de referência em acolhimento.

Mas, quem busca atendimento por ali não se mostra nada satisfeito. Eliane Belfort, presidente da Associação das Mulheres Progressistas (AMP), relata que há inúmeras denúncias sobre a inoperância da DDM em Guarujá.

“Nós que trabalhamos diretamente com mulheres em comunidades recebemos inúmeras denúncias de que a Delegacia da Mulher não funciona e que o atendimento é péssimo”, relata. Eliane conta que, recentemente, entrou em contato com a Secretaria de Segurança Pública do Estado de São Paulo relatando o problema.

“Levei pessoalmente uma carta através do Conselho da Condição Feminina do Estado de São Paulo fazendo denúncia do nossa DDM, que não funciona”, afirma. “Nós, enquanto Sociedade Civil Organizada, junto à Ordem dos Advogados do Brasil em Guarujá (OAB/Guarujá) já fizemos várias visitas no local. No início diziam que era falta de infraestrutura. Agora que tem local adequado dizem que o problema é a falta de pessoal adequado. No meu entender o que falta é comprometimento com a causa”, afirma Eliane.

E continua: “Durante a pandemia as mulheres nem podiam entrar na delegacia. Um descaso total. E isso é voz corrente. Qualquer entidade que acompanhe uma mulher na DDM sai de lá reclamando, por ser mal atendida ou por nem sequer ser atendida. Eu mesma levei um caso de assédio de um zelador a uma condômina, e não fomos atendidas. Nos orientaram a fazer BO pela internet”, relata Belfort com indignação.

Outro relato que depõe contra a DDM Guarujá vem de Neide Passos, presidente do Instituto Tumbansi de Guarujá. Segundo ela, quando precisou encaminhar vítimas pela sua entidade, foi mal atendida.

“O acolhimento foi zero. Eu sou assistente social e fui muitos anos atuante na área da saúde. O melhor antibiótico para uma mulher vilipendiada é o acolhimento. Quando uma pessoa vitimizada chega em um lugar para ser atendida o mínimo é ser bem recebida, ser bem tratada. Senão essa mulher vira as costas e vai embora com o seu problema”, explica.

Segundo Belfort, a Delegacia da Mulher de Guarujá deveria ser a porta de entrada da rede municipal. “Mas, essa rede se concentra em pessoas. Por exemplo, a pessoa tal faz atendimento no CRAS. Não tem uma rede de fluxo como deveria, para o amplo atendimento e acolhimento de todas que precisam”, finaliza.

Parte da demanda na rede municipal vem da DDM

Em nota, a Prefeitura de Guarujá informa que conta com vários serviços e programas de atendimento a mulher vítima de violência. Com relação ao atendimento psicológico, informa que as mulheres vítimas de violência doméstica recebem o acolhimento dos psicólogos do Núcleo de Apoio à Saúde da Família (Nasf) das Unidades de Saúde da Família (Usafas) da rede municipal.

A Coordenação de Saúde Mental da Prefeitura está articulando com toda a Rede de Atendimento Psicossocial (Raps) e todos os atores envolvidos no atendimento à mulher vitimizada, como a Patrulha Maria da Penha, Defensoria Pública, Centros Especializados de Assistência Social (Creas) e Delegacia da Mulher para ampliar o atendimento.

A DDM Guarujá funciona de segunda a sexta-feira das 9h às 19h. Para denunciar, a vítima pode ligar na Central de Atendimento à Mulher pelo 180, pelo 190 (Polícia Militar) ou ir diretamente à Delegacia da Mulher, que fica na Rua Washington, 227 – Vila Maia (Centro).

À noite, fim de semana e feriados, o atendimento é realizado na Delegacia de Polícia Sede de Guarujá (Av. Puglisi, 656 – Centro). Além disso, conta com o boletim eletrônico: www.delegaciaeletronica.policiacivil.sp.gov.br

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